Se você não é
cristão e veio parar aqui não garanto que vai concordar com cada um
dos argumentos, mas toda crença, religiosa ou não, tem base em
premissas de linguagem (conceitos), e a linguagem é redutível à
lógica.
Falamos de um
criador que compõe um universo cheio de regras apenas pelo poder de
suas palavras mas, por algum motivo, há coisas ruins e inexplicáveis
num mundo que foi, cremos, foi criado bom, daí precisarmos ser
"salvos" de diversas coisas. Parando pra pensar, isso não
difere muito de um cara que desenvolve um programa no seu computador
e depois percebe que o programa tem bugs, ou quando você acaba de
comprar um PC novo e, na primeira semana de uso, pega um vírus.
Gosto tanto das metáforas de informática que outras vão aparecer
em vários pontos aqui.
Antes de falar
do Paradoxo da Salvação precisamos ter um panorama geral sobre a
religião cristã, sobre o pecado e sobre o julgamento de Deus sobre
as ações humanas: há uma moral absoluta na crença do cristão,
sendo ela equivalente ao próprio caráter de Deus. No Antigo
Testamento Deus expôs seu caráter a partir de um conjunto de leis
morais, religiosas e civis conhecida como Torah ou "Lei de
Moisés". Um dos pontos da lei mosaica chama atenção, pois ela
estabelecia a morte de animais como sacrifício para aplacar a ira da
divindade com a conotação de perdão de pecados (a parte do
sacrifício, inclusive, é algo em quase todas as religiões
antigas). Mas, de onde isso veio?
Na cosmovisão
cristã, isso veio de algo prometido e ilustrado pelo próprio Deus
em Gênesis 3: Deus mata (um cordeiro, talvez?) para fazer peles e
cobrir a nudez de Adão e Eva após o pecado original humano). O
mesmo tipo de sacrifício foi praticado por Abel possivelmente em
reverência e esperança nessa promessa (você pode ler isso em
Gênesis 4: o sacrifício de Abel foi um sacrifício de animal,
diferente do de Caim, que ofereceu do fruto da terra quem sabe
pensando algo como “já que Deus havia expulsado seus pais do
jardim por uma droga de fruta, por que não tentar?”).
Se entendermos
as coisas por esse prisma, a morte vem como resposta de Deus ao
pecado e, com ela, a necessidade do sacrifício. O apóstolo Paulo
vai além e nos mostra que o pecado havia criado uma nova lei natural
- a Lei da morte:
"O
aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei."
1 Coríntios
15:56.
Se essa
interpretação estiver certa, a morte só passa a existir a partir
do momento que o pecado é introduzido na criação. No Antigo
Testamento, instituiu-se o sistema de sacrifícios em que o animal
morria, literalmente, no lugar da pessoa que pecasse contra algum dos
mandamentos divinos, de modo a ganhar tempo até que o próprio Deus
redimisse por completo a sua criação.
Desde então, as
pessoas morrem, gerações após gerações, pelos mais variados
motivos. Quem pecar morrerá em algum momento (Ezequiel 18:20), assim
como uma maçã arremessada ao longe, eventualmente, cai ao chão
pela força da gravidade... independente da força do braço que a
arremessa.
O sacrifício de
animais era temporário até que o Messias viesse, daí cessariam
devido ao cumprimento da promessa da morte de Cristo, a qual
estenderia as virtudes de Cristo e sua ressurreição a todos aqueles
que cressem, confessando e seguindo a Cristo. Assim sendo,
dizemos que Cristo morreu em lugar dos pecadores como sacrifício
definitivo.
Eis mais um
ponto necessário de se explicar ao leigo: a morte de Cristo é um
paradoxo! Deus achou uma brecha em sua própria lei para não ter que
destruir a humanidade: ao estender as virtudes perfeitas do
homem-Deus que morreu sem pecado no lugar dos pecadores, pela
ressurreição de Cristo, temos o paradoxo do inocente que carregou
os pecados de todo o mundo e ganhou o direito de redimir todo aquele
que nEle crê (João 3:16)!
Imagine que Deus
seja um programador de computador e no app da Criação, no
"software" do nosso mundo, há uma linha de comando que
diz:
“Todo
aquele que pecar morrerá.”
Gênesis
2:16-17 e Ezequiel 18:4, parte B
&
“Todos
pecaram e destituídos estão da glória de Deus.”
Romanos
3:23
E se não apenas
o homem foi afetado, mas toda a natureza, recebendo os efeitos da
"lei da morte"?
"A natureza
criada aguarda, com grande expectativa, que os filhos de Deus sejam
revelados. Pois ela foi submetida à inutilidade, não pela sua
própria escolha, mas por causa da vontade daquele que a sujeitou, na
esperança de que a própria natureza criada será libertada da
escravidão da decadência em que se encontra, recebendo a gloriosa
liberdade dos filhos de Deus. Sabemos que toda a natureza criada geme
até agora, como em dores de parto. E não só isso, mas nós mesmos,
que temos os primeiros frutos do Espírito, gememos interiormente,
esperando ansiosamente nossa adoção como filhos, a redenção do
nosso corpo."
Romanos 8:19-23
A consequência
óbvia é que toda a criação deveria morrer, gradualmente, até sua
extinção eterna. Inclusive, a mais severa demonstração dos
efeitos do pecado no relato bíblico foi o Dilúvio: Se pecar, logo,
morrerá (cf. Gênesis 2:17). Simples assim… E, infelizmente,
existem muitas formas de morrer.
O que nos leva
ao problema de culpar um inocente para preservar o real culpado: uma
ideia bizarra, de fato, mas guarda um sentido metafórico quando
observamos que os animais sacrificados nos rituais do Antigo
Testamento eram (em geral) comidos para manter a vida daquele que
come, imagem relembrada e reinterpretada por Jesus no rito da ceia
(Lucas 22 e 1 Coríntios 11:23-29).
A ideia de
associar alimentação e sobrevivência com um ensino moral é
antiguíssima. Mata-se para comer e, pela morte do devorado, o
devorador pode viver mais um dia. O esquema é muito simples e
universal a nível psicológico: o que explica não apenas o sentido
religioso dos sacrifícios do tabernáculo e do templo no Antigo
Testamento mas também da santa ceia instituída por Jesus Cristo no
Novo Testamento.
Se quem peca,
por lei natural, deve morrer, então o que acontece se alguém que não peca de
fato chegar a morrer?
Pelas linhas de
comando do paradoxo divino, o não-pecador que morre pelo pecado dos
outros não só terá sua vida de volta como ganha o direito a outra
vida: a daquele por quem ele morreu pois já pagou a consequência
dos pecados daquele que realmente teve culpa! Parece
vídeo game!
Dá pra
complicar ainda mais a questão: imagine agora que o não-pecador que
morresse fosse, em realidade, naturalmente imortal. O que segue daí?
Que a nova vida ganha pelo não-pecador ressuscitado também o será!
Agora imagine ainda que a pessoa imortal que nunca pecou (porém
morreu) fosse, além de tudo, o próprio Criador da vida! Seguindo a
ideia de que essa regra é uma lei universal, como uma linha na
programação do código-fonte de um software; se, no começo,
através do pecado, toda a criação foi corrompida, pelo paradoxo da
salvação e sacrifício de Cristo em nosso lugar, o criador cede o
direito de fazer novas todas as coisas e estender essa nova vida
adquirida (ou, como prefiro dizer, hackeada) pelos méritos de Cristo
sobre a criação como quem sobrescreve um arquivo corrompido por um
novo, consertando o sistema.
Estranho? Sim...
Incoerente? Não! Paradoxal? Com certeza. Verdadeiro? Para todo que
crê...
"Ora, sem
fé é impossível agradar a Deus; porque é necessário que aquele
que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador
dos que o buscam."
Hebreus 11:6
"Porque, se
a aspersão do sangue de bodes e de touros, e das cinzas duma novilha
santifica os contaminados, quanto à purificação da carne,
quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno se ofereceu
a si mesmo imaculado a Deus, purificará das obras mortas a vossa
consciência, para servirdes ao Deus vivo?"
Hebreus 9:13-14
"Pois onde
há testamento, necessário é que intervenha a morte do testador.
Porque um testamento não tem torça senão pela morte, visto que
nunca tem valor enquanto o testador vive."
Hebreus 9:16-17
"Porque
Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para
que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna."
João 3:16
"Porque o
Filho do homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus anjos; e
então retribuirá a cada um segundo as suas obras."
Mateus 16:27
No próximo episódio: O PARADOXO DO
"CEDO VENHO"!
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