Já sabemos que um paradoxo pode
ser caracterizado como uma contradição aparente, mas não real, entre argumentos
ou um problema lógico sem solução. No capítulo anterior falamos um pouco sobre
os paradoxos de Zenão. Eis agora outro clássico exemplo, o paradoxo do Barbeiro:
"Suponha-se
que exista uma cidade com apenas um
barbeiro do
sexo masculino. Nesta cidade, todo
homem se mantém
bem barbeado, incluindo o próprio barbeiro.
Todos os homens
dessa cidade fazem exatamente uma de duas coisas:
1. Ou se
barbeiam ou
2. Frequentando
o barbeiro
Outra maneira
de definir isso é: O barbeiro é um
homem da cidade
que faz a barba de todos
os outros, e
somente dos homens que não
barbeiam a si
mesmos. Tudo isso parece
perfeitamente
lógico, até que se coloca a questão
paradoxal:
Quem barbeia o
barbeiro?
Esta questão
leva a um paradoxo porque, de
acordo com a
afirmação acima, ele pode ser
barbeado por:
1. Ele mesmo,
ou
2. O barbeiro
(que também é ele mesmo)
No entanto,
nenhuma destas possibilidades é
válida, porque:
1. Se o homem
barbeiro barbear-se a si mesmo, então
ele mesmo não
deve barbear a
si mesmo (pois
não poderia ser barbeiro).
2. Se o homem
barbeiro não barbeia-se a si mesmo,
então ele, o
barbeiro (que é ele pŕoprio) deve barbear a si
mesmo."
Adaptado de:
pt.wikipedia.org/wiki/Paradoxo_do_barbeiro
Paradoxos são muito divertidos e
encantam os estudos de lógica, mas nosso bom senso sabe que muitos problemas
existem apenas nas ideias, não em realidade. No caso do barbeiro, o mesmo
poderia tanto se barbear como se barbear num barbeiro de confiança da cidade
vizinha, deixar a própria esposa barbeá-lo, etc.
E o que isso tem a ver com a Bíblia?
Bem, me corrijam se eu estiver
errado, mas me parece que a Bíblia está repleta de PARADOXOS.
Não me entenda mal! Não pertenço
a nenhuma vertente teológica que advogue a posição de que a Bíblia possua erros
doutrinários: não penso dessa forma, nunca pensei. Só quero deixar claro que,
atualmente me parece que a Bíblia possui seus paradoxos (inclusive na questão
da obediência a Deus) tendo mais tons de cinza entre o preto e branco que é
pregado nas igrejas.
Veja alguns exemplos das próprias
escrituras:
*Em Levítico (o livro todo): Deus
institui o sistema sacrificial e os rituais do templo, mas em Oséias 6:6 Deus
reprova o sacrifício e diz que seu real desejo era a obediência.
*Em Êxodo 20:13 há o famoso
mandamento "Não matarás", mas o mesmo Deus ordena em Números 31 um
morticínio (entre outros registrados na Bíblia).
*Em Mateus 15:8-9 Jesus diz que o
povo louvava a Deus com os lábios, mas estava com o coração longe dele.
*Por último, em Tiago 1:27 há a
menção que resolvi transcrever na íntegra:
"A
religião que Deus, o nosso Pai, aceita como pura e
imaculada é
esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em
suas
dificuldades e não se deixar corromper pelo
mundo."
Pra mais alguém pareceu que Deus
está mais interessado em praticar o amor cristão que em obedecer regras?
Há uma discussão a esse respeito
também com a questão se deve ou não um cristão ser militar/policial? Por conta
da regra do "não matarás", obviamente. Outra questão seria a do 4.º
mandamento estar ou não em vigor (a guarda do sábado), em que a situação é a
mesma e ainda há a questão da dieta apresentada em Levítico 11 na qual, entre
outras coisas, a carne de porco (atualmente a mais consumida no mundo*) é
declarada imunda e imprópria para alimentação. Então eu pergunto: É possível
transgredir um mandamento para obedecer outro? Aliás, se as transgressão de um mandamento
incorre na obediência de outro, ainda é transgressão?
Parecem paradoxos, certo? Parecem
paradoxos porque SÃO PARADOXOS!
Há um trecho emblemático no
Antigo Testamento em Êxodo 1 que ilustra o que quero dizer: as parteiras
hebréias, às quais faraó havia ordenado que matassem os filhos dos hebreus
(escravos no Egito), MENTIRAM para preservar a vida das crianças (isso é
narrado antes da história de Moisés).
Prestes atenção: A Bíblia não
relata a "opinião" de Deus a respeito da atitude das parteiras. Mas
ela registra o fato nos deixa um paradoxo. Vale mentir pra não matar? Lembrando
que isso não tem nada a ver com o fato dos 10 Mandamentos terem sido dados por
escrito depois. E é na própria Bíblia que se argumenta nessa linha:
"Porquanto,
o que de Deus se pode conhecer, neles se manifesta, porque Deus lho
manifestou. Pois os seus atributos invisíveis, o seu eterno poder e
divindade, são claramente vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos
mediante as coisas criadas, de modo que eles são inescusáveis;"
Romanos 1:19-20
"(...)
pois mostram que as exigências da Lei estão
gravadas em seu
coração. Disso dão testemunho
também a sua
consciência e os pensamentos deles,
ora
acusando-os, ora defendendo-os.) Isso tudo se
verá no dia em
que Deus julgar os segredos dos
homens,
mediante Jesus Cristo, conforme o declara o meu evangelho."
Romanos 2:15-16
Paulo falava que não é possível
estar alheio a Deus e sua existência e atributos (e aqui inclui-se o caráter de
Deus) em sua criação e em nossa própria mente.
Em diversos tópicos da fé cristã,
como o estado do homem na morte, salvação, perdão, caridade, juízo divino, e
até assuntos mais sutis como as profecias há vários pontos que não são tão
claros. O número de igrejas cristãs diferentes que o diga!
Seria um paradoxo que um Deus que
não muda de caráter tenha tornado algumas leis obrigatórias no Antigo
Testamento como opcionais ou mesmo revogadas no Novo Testamento?
Fica a reflexão.
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