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sábado, 17 de agosto de 2013

DIFICULDADES NAS TRADUÇÕES... E PARADOXOS! ☑


Apesar de estar na série "Paradoxos Bíblicos" o tema de hoje não é exatamente um paradoxo... Na verdade, até é dependendo de qual tradução bíblica você tem em mãos.

Vamos ao ponto: é de conhecimento geral que há uma enormidade de traduções da Bíblia: NVI, VIVA, Edições Paulinas, ARA, ARC, ARF, NTLH, Novo Mundo, Bíblia de Jerusalém, etc. Isso apenas pra falar de algumas das traduções em Português.

Não pretendo me deter em demonstrações de diferenças nas traduções porque isso é algo óbvio, esperado e, até certo ponto, desejável. Não me entendam mal, qualquer pessoa que tenha conhecimento de mais de um idioma sabe que existem palavras que não têm equivalente em outros idiomas. Alguns exemplos que você com certeza já ouviu: os esquimós tem 8 palavras diferentes pra "neve", português é o único idioma que possui a palavra "saudade" e os gregos tem 4 palavras diferentes pra "amor".

Palavras nos ajudam a pensar porque descrevem o que queremos dizer, mas há algo engraçado com sinônimos: nem todos têm, de fato, o mesmo significado exato, por isso às vezes, quando esquecemos a palavra exata que queríamos usar e alguém fala um sinônimo dá aquela sensação de "serve, mas não era bem isso que eu queria dizer". Que dizer então da pontuação, que nem existia antes do século XVI e tem o poder de mudar o sentido inteiro de uma frase!

Com a Bíblia acontece algo parecido, o problema é que isso acontece mesmo em pontos doutrinários considerados importantes, como Lucas 23:43 onde uma vírgula muda o sentido de  toda a frase e cria uma noção quase espírita de vida após a morte:

"Respondeu-lhe Jesus (ao ladrão arrependido): Em verdade te digo hoje estarás comigo no paraíso." Lucas 23:43

Que alguns grafam assim...

"Respondeu-lhe Jesus (ao ladrão arrependido): Em verdade te digo hoje, estarás comigo no paraíso." Lucas 23:43

Ponto do paradoxo: a pontuação não existia até quase final da Idade Média (séculos XVI e XVII)*, logo, a tradução mais correta é a primeira. Então por que nossas igrejas não ensinam apenas a promessa da ressurreição para juízo de salvação ou condenação mas nos alegam que a morte é seguida de recompensa, para bem ou para mal, e imediata?

Existem outros casos estranhos, por exemplo, na tradução ARC o termo "gordura" de Isaías 10:27 consta traduzido como "unção" na NVI, alterando consideravelmente o sentido da frase.


Quem nunca pegou uma Bíblia de uma tradução diferente da que estava acostumado, olhou um versículo chave e pensou “não era bem isso que eu estava procurando”, atire a primeira Bíblia!


Além disso, apenas para citar como exemplo de fácil constatação: pegue uma Bíblia das traduções de Almeida e compare com a Bíblia Viva e vai notar vários versículos fora da estrutura: ora adiantando, ora retardando o texto. Isso em si não é uma coisa tão grave assim, já que a Bíblia foi dividida em versículos em 1551, sabia?


O texto bíblico, em si, como qualquer outro, precisa de contexto pra ser compreensível. A divisão em versículos só se deu pra ajudar a encontrar textos e estudar a bíblia com mais facilidade, mas pode dificultar o entendimento isolando alguns textos de seus contextos.

A doutrina da imortalidade da alma do homem em comparação com a mortalidade da alma animal em Eclesiastes 3:21, por exemplo, é, pelo contexto, uma pergunta, mas é ensinado como se fosse uma afirmação pela maior parte da Cristandade (vá saber se não foi por má pontuação em traduções anteriores).

Sendo assim, diferenças doutrinárias entre grupos cristãos apareceram a torto e a direito. Qual seguir nesses casos? Aliás, como confiar na versão da Bíblia que você está lendo? Dá pra confiar que não traduziram uma palavra-chave errado em um texto importante? Um exemplo: não há consenso entre os cristãos se devemos ou não nos abster de bebidas alcoólicas baseado nos termos hebraico, aramaico e grego serem ou não designativos de vinho alcoólico, o que eu particularmente considero ser pedir demais pro público leigo se decidir, seja nesse ou em qualquer outro ponto doutrinário. A análise de contexto não seria mais que suficiente ante essas perdas semânticas? 

Como se não bastasse, e se as várias traduções bíblicas apresentarem discrepâncias nas traduções de tempos verbais? Me assustei ao comparar o texto de Lucas 24:27 numa tradução ACF e numa NVI. Comparem:

ACFE, começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras.

NVIE começando por Moisés e todos os profetas, explicou-lhes o que constava a respeito dele em todas as Escrituras.

Reconheço que, nesse caso não há prejuízo de contexto, afinal  temos ambos os casos no tempo passado (no primeiro caso trata-se do pretérito imperfeito do indicativo e, no segundo, do pretérito perfeito) mas minha mente voou no momento ao imaginar: seria possível que haja algum caso de mudança de tempo verbal entre traduções diferentes? Afinal, é provável que haja OUTROS MAIS!

Alguém se arrisca a dizer que não existe diferença real no uso de um “foi” no lugar de um “será” numa frase? Para ajudar nesses casos deixo para vocês um alerta:

“Tempos verbais em hebraico denotam ação, não do tempo: o tempo perfeito denota ação concluída, e o imperfeito denota ação incompleta. Assim, o pretérito imperfeito pode ser traduzido como presente ou futuro, e isso pode causar problemas na tradução. A dificuldade é que para a mente hebraica, mesmo algo concluído pode ser no futuro: "Por exemplo, eu posso dizer "meu pai me ensinou sobre a vida", que é escrito no pretérito. Enquanto meu pai me ensinou há muitos anos, nós vemos isto como tempo passado e na mente hebraica é uma ação concluída. Mas, na mente hebraica esta ação concluída existe no passado, presente e no futuro."¹

Detalhes técnicos de traduções e doutrinas dúbias ante um mesmo texto são difíceis de digerir assim como paradoxos, pois num mesmo texto, ainda que com ligeiras alterações, deveria-se sempre manter uma interpretação única: a do que o autor quis dizer, ao invés de dar margem para múltiplas interpretações.

O que me consola nessas horas é o texto de Tiago 1:27:

"Para Deus, o Pai, a religião verdadeira é esta: Ajudar os órfãos e viúvas nas suas aflições e não se manchar com as coisas más deste mundo."

Eu digo "amém" a isso!

Fontes:

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